Primeiro abre-se a porta / por dentro sobre a tela imatura onde previamente /se escreveram palavras antigas: o cão, o jardim impresente, /a mãe para sempre morta. / Anoiteceu, apagamos a luz e, depois, / como uma foto que se / guarda na carteira, / iluminam-se no quintal as flores da macieira / e, no papel de parede, agitam-se as recordações. / Protege-te delas, das recordações, / dos seus ócios, das suas conspirações; / usa cores morosas, tons mais-que-perfeitos: / o rosa para as lágrimas, o azul para os sonhos desfeitos. / Uma casa é as ruínas de uma casa, / uma coisa ameaçadora à espera de uma palavra; / desenha-a como quem embala um remorso, / com algum grau de abstracção e sem um plano rigoroso. Nasceu a 18 Novembro 1943 (Sabugal). Morreu em 19 Outubro 2012. Manuel António Pina foi um jornalista e escritor português, premiado em 2011 com o Prémio Camões.
Primeiro abre-se a porta / por dentro sobre a tela imatura onde previamente /se escreveram palavras antigas: o cão, o jardim impresente, /a mãe para sempre morta. / Anoiteceu, apagamos a luz e, depois, / como uma foto que se / guarda na carteira, / iluminam-se no quintal as flores da macieira / e, no papel de parede, agitam-se as recordações. / Protege-te delas, das recordações, / dos seus ócios, das suas conspirações; / usa cores morosas, tons mais-que-perfeitos: / o rosa para as lágrimas, o azul para os sonhos desfeitos. / Uma casa é as ruínas de uma casa, / uma coisa ameaçadora à espera de uma palavra; / desenha-a como quem embala um remorso, / com algum grau de abstracção e sem um plano rigoroso. Nasceu a 18 Novembro 1943 (Sabugal). Morreu em 19 Outubro 2012. Manuel António Pina foi um jornalista e escritor português, premiado em 2011 com o Prémio Camões.