«Livre. Livre dos equilíbrios consensuais a que obrigam a formação universitária ou a rotina do jornalismo cultural. Livre das programações ideológicas que distribuíam com impiedosa cegueira os ocupantes do campo amigo e os do campo adversário. Livre dos condicionalismos que impunham um calão científico ou uma simplificação demagógica. Livre também para poder ser incoerente, contraditório, instável, deambulante, provocador, terno, insidioso, segundo a cadência emocional das horas e dos dias. Setembro é o teu mês: e de súbito a morte de um amigo, e o insensato desentendimento em que se perderam, suscitou o desejo de uma palavra que recuperasse tudo o que nos surge sob a forma do irreparável e do irreversível — tudo o que não escrevi, afinal. Porque o tempo era mais urgente do que os códigos. Livre também dos códigos e das fórmulas. Entregue apenas ao sabor das palavras — cada página é a página de rosto de um arquivo de afectos. Um rosto. Este é o primeiro dia do resto dos teus livros — disse A., quase em surdina, encostado à porta do quarto. O primeiro dia, sim, claro (concordaste), mas ainda me falta a primeira palavra.»
Este é o 1º volume (1991-1992) do diário inédito de Eduardo Prado Coelho, uma das figuras mais marcantes da vida intelectual portuguesa.
«Livre. Livre dos equilíbrios consensuais a que obrigam a formação universitária ou a rotina do jornalismo cultural. Livre das programações ideológicas que distribuíam com impiedosa cegueira os ocupantes do campo amigo e os do campo adversário. Livre dos condicionalismos que impunham um calão científico ou uma simplificação demagógica. Livre também para poder ser incoerente, contraditório, instável, deambulante, provocador, terno, insidioso, segundo a cadência emocional das horas e dos dias. Setembro é o teu mês: e de súbito a morte de um amigo, e o insensato desentendimento em que se perderam, suscitou o desejo de uma palavra que recuperasse tudo o que nos surge sob a forma do irreparável e do irreversível — tudo o que não escrevi, afinal. Porque o tempo era mais urgente do que os códigos. Livre também dos códigos e das fórmulas. Entregue apenas ao sabor das palavras — cada página é a página de rosto de um arquivo de afectos. Um rosto. Este é o primeiro dia do resto dos teus livros — disse A., quase em surdina, encostado à porta do quarto. O primeiro dia, sim, claro (concordaste), mas ainda me falta a primeira palavra.»
Este é o 1º volume (1991-1992) do diário inédito de Eduardo Prado Coelho, uma das figuras mais marcantes da vida intelectual portuguesa.